O que é tradução?
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  • Foto do escritorHellen M. Amorim

O que é tradução?

Atualizado: 22 de fev.

Um guia completo para esclarecer o admirável trabalho do tradutor


 


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Introdução


Imagine que você é um ceramista. Você está trabalhando na réplica de um grande vaso. Com foco no original, você o modelou por um certo tempo e ele já descansou. Há pouco, você refinou sua forma. Você o lixou, deu algumas pinceladas gerais no fundo e o coloriu. Agora, é preciso cuidar dos últimos detalhes. Você precisa ver se tem algo fora do lugar que pode ser reparado e dar o último arremate.


Pronto, você o fez! Ficou lindo!


Assim como um ceramista, o escritor é alguém que faz arte com as mãos. Escrever é como trabalhar e modelar o vaso reproduzido. Preparar é como refinar a peça. Revisar é como reparar o que ficou aquém. Seguindo esses passos, o trabalho resultará na sua melhor versão possível.


É sobre essa primeira e basilar etapa da produção de um texto que vamos conversar. Porém, nos ocuparemos do trabalho de um escritor especial, o tradutor.


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1 O que é tradução?


O Homo sapiens surgiu na África Oriental, cerca de 200.000 anos atrás. Nessa época, os grupos humanos eram pequenos e a linguagem que os unia era uniforme. Porém, com o aparecimento de mais e mais indivíduos, os aglomerados humanos foram se dispersando e algo interessante ocorreu: a comunicação intergrupal passou a ser tão específica a ponto de uma língua ser, praticamente, ininteligível para aqueles de fora da comunidade.


Quanta beleza e tragédia coincidem nesse fato: o vínculo coexiste com a desconexão, a assimilação coexiste com a incompreensão, o pertencimento coexiste com a marginalidade.


Por sorte, a origem de todas as línguas que existem, que já existiram ou que ainda existirão, está em uma estrutura universal: o cérebro. Por mais diversas que as criações linguísticas possam ser, ainda estão organizadas sob bases compartilhadas por cada ser humano. E é essa unidade que torna possível a tradução, um serviço de simples conceituação:


Tradução é o processo de transposição ou de correspondência das ideias escritas originalmente em uma língua (língua de saída) para outra (língua de chegada).

É certo que nenhum idioma se encaixa perfeitamente em outro, de modo que todas as palavras ou expressões sejam traduzidas de maneira direta ou completa. Sabe aquela resposta brilhante que surge na sua mente somente após a situação ter passado (quase sempre no banho)? Aquele momento em que você diz a si mesmo: “Nossa, eu devia ter falado isso!” Então, essa sensação tem um nome: treppenwitz. É alemão. Não existe um correlato em português.


Porém, a magia da tradução reside justamente nisso: embora possa não haver um vocábulo específico na língua de chegada, é sempre possível descrever aquilo a que ele se refere. Nesse ponto, o paradoxo se desfaz: por mais que as expressões pareçam indecifráveis, suas procedências são inerentemente humanas. Assim, a palavra “treppenwitz” pode se tornar, em determinado contexto, “aquela sacada que você pensa só depois”. Mesmo que haja uma pequena perda da nuance cultural originária, o nativo em português é capaz de entendê-la e de identificar-se na descrição.


A tradução permite dar sentido ao desconhecido e romper as barreiras ilusórias do indizível.


O mais importante é que o tradutor se atente a duas preocupações: respeitar o autor do texto original e proporcionar uma boa experiência ao leitor do texto traduzido. Desse modo, ele deve preservar o conteúdo primordial, sem colocar ou tirar palavras dos dedos do autor, e deve permitir que o leitor compreenda o texto como se este tivesse sido escrito originalmente em sua língua nativa.


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2 O que é traduzido?


A gama de possibilidades para a tradução é vasta. Pode-se traduzir:


  • documentos oficiais;

  • livros;

  • sites e blogs;

  • campanhas publicitárias;

  • trabalhos acadêmicos;

  • filmes, documentários e outros materiais audiovisuais;

  • manuais de produtos;

  • jogos de videogame ou de computador;

  • histórias em quadrinhos;

  • e, até mesmo, cartas, poemas e músicas.


É fácil notar que, diante dessa variedade, as especialidades no ramo da tradução são a regra. Por mais que um livro de ficção, um filme de fantasia e uma história em quadrinhos guardem semelhanças – apresentam, por exemplo, muitos diálogos e muitas descrições de personagens –, suas particularidades justificam a existência de tradutores específicos para cada um deles.


No livro, o tradutor, em regra, tem mais espaço para criar do que o tradutor de dublagem ou de legendagem, que trabalha com espaços limitados – o movimento da boca do ator, no primeiro caso, e o tamanho da linha da legenda, no segundo. Já o tradutor da história em quadrinhos tem que lidar com a linguagem não-verbal que subsidia as falas dos personagens.


Aqui, na Merida Escrita, nos focamos na tradução de manuscritos, ou seja, de originais que já deram ou darão vida a livros, sejam impressos, sejam digitais.


2.1 Tradução editorial


Você, certamente, já reparou que muitas das ideias que mudaram suas concepções sobre determinado assunto vieram de não brasileiros. Noções relacionadas à Física, por exemplo, estão permeadas de concepções sugeridas ou descobertas por alemães. Pessoas como Albert Einstein, Erwin Schrödinger e Max Planck influenciaram sua perspectiva acerca do funcionamento do mundo natural.


Todas as ideias desses estudiosos chegaram a você, direta ou indiretamente, por meio de um livro traduzido por uma editora. Esse processo que envolve o caminho “original em língua estrangeira-editora-original traduzido” é o mais comum quando se trata de tradução de manuscritos e pode ser assim entendido:


A tradução editorial é o processo de tradução de obras estrangeiras geralmente intermediado por uma editora.

Como é perceptível, trata-se de um conceito abrangente, já que as obras estrangeiras podem ser de ficção ou de não ficção.


Em relação às primeiras, a tradução recebe um nome especial: “tradução literária”. Como a função do texto literário abarca a estética, as possibilidades de criação são ilimitadas. Assim, um manuscrito de ficção pode ser, por exemplo, um simples compilado de contos para adolescentes ou um intricado romance escrito com palavras de cinco letras cuja combinação estética só funciona na língua de saída.


As obras de não ficção, porém, não ficam atrás em termos de especificidades. Um manuscrito de não ficção pode ser, por exemplo, uma obra de divulgação sobre um tema já muito debatido socialmente ou um complexo material acadêmico escrito por um autor renomado que é uma das únicas três pessoas do mundo que domina o tema.


Portanto, na tradução editorial, é preciso alinhar as necessidades e as expectativas da editora com as possibilidades e as habilidades do tradutor. Tudo vai depender do caso concreto. Eu, por exemplo, prefiro trabalhar com obras de não ficção nas áreas de Psicologia Cognitiva e de Neurociência Cognitiva, que são minhas áreas de interesse acadêmico, mas um romance que abarque questões sobre o funcionamento da mente também se encaixaria no meu perfil.


2.2 Tradução semelhante à tradução editorial


No conceito de tradução editorial optamos pelo uso da palavra “geralmente”. Isso tem um porquê. Embora a maioria das traduções a que temos acesso advenha de uma editora, nada impede que manuscritos sejam traduzidos de forma independente para fins diversos.


Um original em língua estrangeira que conta a trajetória de vida de uma pessoa extraordinária pode servir, por exemplo, de subsídio para escrever o roteiro de uma palestra motivacional. Nesse caso, a tradução será semelhante à tradução editorial, mas para uma pessoa física.


Outro exemplo seria o de uma obra de divulgação científica ainda não traduzida para o português, mas que servirá de material de estudo para um grupo de estudos. Caso os integrantes desse grupo não dominem a língua de saída do original, podem contratar uma tradução semelhante à tradução editorial.


As técnicas de tradução serão as mesmas utilizadas na tradução editorial, bem como o compromisso com o respeito ao autor e com a experiência do leitor.


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3 Qual é a importância da tradução?


Por muito tempo, as culturas humanas funcionaram como ilhas. Em cada uma delas havia tesouros na forma de conhecimentos e de histórias que eram acessíveis somente aos locais.


Um dos maiores feitos da humanidade foi a construção dessas ilhas, que gerou imensa riqueza cultural, e a posterior reunião entre elas, que gerou o intercâmbio cultural. É certo que nem todos os encontros foram amistosos, mas todos contribuíram, em alguma medida, para a edificação da nossa realidade. Das ilhas inacessíveis, pouquíssimas restaram. O mundo é, de fato, um grande arquipélago, onde todos estão conectados.


Nesse cenário, a tradução funciona como o meio de transporte que leva os habitantes de uma ilha para outra e os permite explorar tesouros antes desconhecidos. E é nisso que reside sua importância: apesar das diferenças culturais, é possível compreender o ponto de vista do outro ao decifrar o que ele diz.


Nós só conhecemos a realidade das ilhas culturais mais longínquas da Amazônia porque existiram tradutores das línguas indígenas. Foram eles quem nos trouxeram as informações em português, foram eles quem nos deram a oportunidade do entendimento. Todos os brasileiros que nunca terão a chance de interagir, pessoalmente, com um indígena amazônico, podem fazê-lo por meio da leitura de falas transcritas e traduzidas.


Imagine, se todos os tesouros culturais fossem inacessíveis, o quanto seria perdido? O quanto seria incompreendido? O quanto seria ignorado? A mente humana é uma máquina fantástica de criação. Ter acesso às criações escritas em outra língua é um privilégio proporcionado pela tradução.


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4 Quem é o tradutor?


No Brasil, o tradutor é muito associado ao profissional formado em Letras ou em Tradução. Esse pressuposto é óbvio, já que são cursos voltados ao estudo dos idiomas. Mas, na verdade, ele pode ser qualquer pessoa que domina a língua de saída (que pode ser o inglês, o espanhol, o francês, o italiano etc.) quanto a língua de chegada (no nosso caso, o português).


Meu domínio do inglês, por exemplo, veio da necessidade e da sede de conhecimento. É impossível seguir na carreira de pesquisa sem saber esse idioma, e as informações em português sobre meu objeto de estudo são limitadas. Assim, ultrapassei a barreira linguística e hoje tenho aptidão nessa língua de saída. Além disso, como sou uma leitora e uma escritora praticante desde pequena, a experiência me trouxe uma boa escrita no português, nossa língua de chegada. Também passei por processos de capacitação na área, me alimentei de livros técnicos e tenho materiais para me auxiliar nos trabalhos concretos.


Essa autonomia para exercer a profissão de tradutor acontece porque ela não é regulamentada (a exceção é a profissão de tradutor e intérprete público, que tem legislação própria). Assim, em tese, qualquer pessoa pode ser um prestador de serviço de tradução. Basta ser comprometido, estudioso, atualizado e entregar um bom trabalho.


O grande diferencial desse profissional é a integralidade: ele conhece muito bem sua língua materna, como um revisor; domina as boas práticas de escrita, como um preparador; e sabe concatenar tudo isso da melhor forma possível, como o escritor que é.


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5 Quanto custa uma tradução?


Como visto, a tradução está presente em diferentes mercados, como o de livros, o de marketing, o de audiovisual, o de jogos e o de músicas.


Logo, cada um desses nichos tem sua própria prática de valores. Porém, por quase sempre se tratar de uma prestação de serviços, cada tradutor dará o preço que considera justo para seu trabalho. Como em qualquer caso, há o risco de o barato sair caro.


Vou focar nos valores correntes no mercado editorial.


No caso dos livros, o valor de uma tradução vai depender de muitos fatores, como o gênero do livro, a extensão do original, o grau de profundidade das informações, a experiência do profissional e o prazo para ficar pronta.


Porém, o mais comum é que o preço do tradutor seja um valor calculado a partir da quantidade de palavras ou da quantidade de laudas do manuscrito original. Nós usamos a segunda opção. O tamanho de uma lauda geralmente varia entre 1.200 e 2.200 caracteres com espaço. Nós trabalhamos com 2.000 porque é um número que se aproxima da lauda literária, utilizada por editoras.


Segundo o SINTRA (Sindicato Nacional dos Tradutores), o custo de uma lauda de tradução editorial gira em torno de R$ 43,00. Assim, alguns tradutores cobram mais ou cobram menos de acordo com os critérios já mencionados.


O fato é que, por ser um trabalho complexo e de grande responsabilidade, o investimento em uma tradução é elevado. Afinal, um bom texto não se faz do dia para a noite e o tradutor precisa, ao mesmo tempo, se manter fiel ao autor e entregar o melhor ao leitor. Essa dedicação tem um custo.


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Encerramento


Parabéns! Você aumentou seu leque de conhecimentos ao compreender os pormenores da tradução.


Se você tem um manuscrito para ser traduzido, considere fazer um projeto conosco! Estamos aqui para colaborar com você. Pode nos chamar! Juntos, vamos entregar a melhor versão da obra intelectual do autor estrangeiro.


Obrigada!


Até mais!

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